domingo, 1 de novembro de 2009

Um clube sem início, meio e fim

Caro leitor, dizem alguns que jornalista da área esportiva não pode, em momento algum, revelar sua paixão clubística. A ética, a imparcialidade (o que é uma aspiração infundada) e as normas jornalísticas não permitem tal atitude. Mas quem escreverá aqui não será eu enquanto estudante de jornalismo. Será Lucas Peixoto, torcedor apaixonado pelo Fluminense Football Club.

Fluminense e Cruzeiro digladiaram no Mineirão dia primeiro de novembro. Um dia marcante para a história tricolor. Um time tresmalhado no começo e guerreiro no final. Foi um primeiro tempo deprimente. O Fluminense não conseguia resistir aos ataques mineiros. Não ditava um ritmo de jogo. O coração ficava apreensivo, enquanto à distância meu pai dizia-me as emoções do jogo por telefone. Meu amor por minha namorada, que é maior do que pelo tricolor, me fazia ausente da partida televisiva.

O Fluminense viu sua chance de gol quando Maicon, depois do lançamento do zagueiro Dalton, foi ao chão de forma incomum. Sobrenatural de Almeida, que não podia ficar fora desse épico embate futebolístico, foi convidado a sair das crônicas de Nelson Rodrigues e aparecer aqui.

Mas o fugidio lance não foi o suficiente para tirar o ânimo do Cruzeiro, que logo depois fez o primeiro gol, aos 13 minutos. O lateral Gilberto passou a bola para o lateral Jonathan marcar. 1 x 0 Cruzeiro. Começa então o desespero ululante dos jogadores. A tênue linha psicológica converte-se em prantos e desespero da torcida.

O lado esquerdo do Fluminense estava desamparado nas costas do jovem Dieguinho. O pobre garoto, que possui qualidades, não era capaz de parar os avanços cruzeirenses, que pareciam titãs recém despertados, loucos para devorar o desprotegido Fluminense e seus atletas.

O pó-de-arroz, em mais um pueril avanço, conseguiu uma boa finalização de Maicon. A bola mudou seu trajeto pelas mãos do goleiro Fábio. Pênalti para o Cruzeiro. Diogo deitou abaixo Guerrón depois de um ingênuo carrinho por trás. Wellington Paulista bateu e... perdeu. Desperdiçou a cobrança depois de jogar a pelota afora.

Para completar o desastre, aos 30 minutos a assombração guerrônica do ano passado toca para Wellington Paulista que, retratando-se, marca para a Raposa. O camisa 9 domina o lance como tal, dribla desconcertantemente o zagueiro, desconsidera o arqueiro e manda aos fundos do gol. 2 x 0 Cruzeiro. E meu pai no sofá, infelizmente sofrendo com minha ausência.

Em seguida, para afligir ainda mais corações verde-branco-grenás, Fabrício, depois de uma sobra de bola conseqüente de um escanteio, domina e manda um chute alá-Rivelino. Bate na trave. O Cruzeiro que poderia estar goleando com fúria avassaladora, sufoca meu time. E do meu pai, que torce desde 76. Convido agora nosso Gravatinha para mudar a situação da partida. Termina o primeiro tempo e a magia tricolor entrará em campo.

Começa o segundo tempo e quem está no estádio percebe o brilho no olhar guerreiro dos jogadores do Flu. Estavam em fúria, prontos para a maior batalha e maior vitória dos últimos tempos. A virada será intensa, de acordo com nossas tradições. Um triunfo com oportunismo, suor e lágrimas.
Em nenhum momento meu pai perdeu a esperança. Coisa rara, vindo de alguém que se irrita facilmente quando nosso time joga mal. Mas dessa vez não. A experiência dele de 33 anos como torcedor me encheu de esperança, como o nosso verde. Eu, do outro lado e envolvido em outra atividade, estava impossibilitado de acompanhar a partida na TV.

Aos 10 minutos, um gol oportunista. Conca jogou na área, Maicon girou desatinado e a história tricolor consagrou-se em Gum, que dominou e mandou o chute na cara do gol. Cruzeiro 2 x 1 Fluminense. Meu pai vibrava de forma arrebatada. A esperança do verde tricolor renasce. O vigor e o amor do grená transcendem. E como disse o narrador, ‘Gum faz o primeiro’. É como se todos soubessem como seria o resultado final.

Aos 13, do meio de campo Conca lança para Fred na entrada da área. O atacante domina, menospreza o Cruzeiro e manda o foguete. O pé adversário ajuda. Gravatinha põe a mão na cronologia. Um gol suado, digno da luta do craque. Fred não comemora em respeito aos mineiros. Ninguém comemora junto. Todos estão insaciáveis, famintos e loucos para devolver o que receberam da Raposa. O óbvio, mais que ululante, reforça a velha filosofia de que “se quiseres saber o futuro do Fluminense, olhai o teu passado. A história tricolor traduz a predestinação para a glória”. Ufa: 2 x 2 Fluminense! As lágrimas do meu pai caem. Começa-se o desatino da santa paixão tricolor

Conca estava jogando com fina classe o futebol que é dele, que é argentino e que é brasileiro. Fred com oportunismo de craque. Maicon com arrancadas radiantes. Faltava o golpe final. Eis que Conca lança Maicon pela ponta direita. O craque avança, dribla o lateral cruzeirense e toca para outro craque – Fred – que domina e, com frieza, mata a partida: Fluminense 3 x 2 Cruzeiro. E mais uma vez não comemora. É o fim. Cruzeiro nocauteado, meu pai em prantos. Então meu celular toca: “Vencemos, vencemos! Vamos sair dessa! Não merecemos cair!”.

Em 18 anos de afinidade e cumplicidade paterna, nunca vi tamanha alegria estampada na face tricolor do ‘meu velho’. Nessa partida percebi que a história do Fluminense não tem início, nem meio e nem fim. Tudo se junta de forma imperceptível e surpreendente. As glórias do passado se traduzem no futuro, e o meu time, o time do meu pai e de uma gloriosa e guerreira torcida vence mais uma batalha. A esperança se renova. Nós não cairemos mais. Jamais. Nosso sol da manhã sempre brilhará.

3 comentários:

  1. Lucas,
    seu texto é de uma sensibilidade incrível. Eu ví em suas palavras refletir minha infância, que um certo tricolor também muito apaixonado, me fez amar esse clube. Parabéns pelo trabalho rapaz... abs.

    Marcos Cabidelli

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  2. Esse daí é apaixonado pelo clube mesmo hein...
    ahauhauhauahua

    Ótimo post, parabéns. :D

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  3. Muito legal, bastante preciso, prendeu minha atenção, sem ser cansativo apesar de não ser torcedora do fluminense.

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