sexta-feira, 9 de julho de 2010

Arianismo enrustido

O título é um pouco pesado para quem ver assim, de supetão. Mas ele veio muito antes de escrever esse texto. Foi quando discutia com um colega sobre qual o treinador ideal para a seleção brasileira. Logo brinquei que se é para ter o melhor técnico, porque não o mestre José Mourinho, campeão da UEFA pela Inter de Milão? O rapaz se intrigou e soltou: “A seleção brasileira nunca terá um técnico estrangeiro para comandar seu time, muito menos jogador naturalizado!”.

A conversa passou e fui pensando sobre essa declaração. Porque não aceitar algo que vem de fora, se todo mundo deleita-se pelo nosso futebol? Quer dizer que não podemos ter apreço pelo estrangeiro, ou que só alguém tradicionalmente brasileiro poderia defender as cores da seleção brasileira? José Mourinho é, atualmente, o melhor técnico do planeta. Consegue montar equipes consistentes defensivamente, com um rigor tático incrível, além de saber lhe dar com estrelas – coisas que o Brasil tem de sobra, sem nenhuma modéstia. Qual técnico brasileiro é melhor que Mourinho atualmente? Ninguém! Ponto parágrafo!

Isso me lembra o velho dogma hitleriano do arianismo. Quer dizer que só os brasileiros são os melhores, e nada mais presta? Se Xabi Alonso, volante espanhol, fosse naturalizado brasileiro, seria titular absoluto dessa seleção de 2010. Até porque sua posição é a mesma do ‘espetacular’ Gilberto Silva, reserva do Panathinaikos da Grécia (!). Ou então se Lionel Messi declarasse o desejo de ser brasileiro, não o deixaríamos vestir o manto canário?

A visão do brasileiro em achar que são os melhores no futebol traduz uma perspectiva preconceituosa e reducionista acerca do que é o esporte. Existem craques lá fora. Da mesma forma que há vida futebolística inteligente em outros continentes.

Nosso futebol é cheio de graça, cheio de arte e beleza. Temos jogadores para dar e vender. Mas vale lembrar que muitos estrangeiros fizeram história no Brasil. O ex-técnico do Honved - HUN de 1954, Bella Guttman, revolucionou a forma tática de jogar futebol aqui na terra do pau-brasil, por exemplo. Teve uma curta passagem pelo São Paulo e utilizou o revolucionário 4-2-4 que, consequentemente, contribuiu para aperfeiçoar o padrão de jogo brasileiro.

Alguns jogadores marcaram época no cenário brasileiro como o uruguaio Pablo Forlán, que atuou no tricolor paulista entre 1970 – 1976, ou o argentino Doval, que fez parte da máquina tricolor carioca em 1975. São alguns dos pouquíssimos exemplos para tentar tirar o preconceito do leitor.

Por isso não se deve fechar os olhos para o futebol bonito lá fora. Não se deve menosprezar outras grandes seleções, pois quando o Brasil tropeça, devemos reconhecer os méritos do adversário, e não procurar a derrota apenas em nossas falhas. É mais um preconceito – entre tantos outros – no país mais ‘misturado’ etnicamente do mundo.

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